“Não é possível que se possa louvar a Deus com entendimento usando composições pobres e
vazias de conteúdo – isso, quando as letras não contêm erros teológicos e até heresias.”
vazias de conteúdo – isso, quando as letras não contêm erros teológicos e até heresias.”
Vivemos na era da música digital. E os muitos sons nos fazem delirar. Foi muita mudança tecnológica, rítmica e cultural que revolucionou o cenário evangélico na área de louvor e adoração. Diante do novo contexto, as opiniões se dividem. O louvor contemporâneo é melhor do que o antigo dos hinários? As mudanças foram para bem ou para mal? Durante décadas, as igrejas tradicionais – presbiterianas, batistas, metodistas – usaram quase que exclusivamente os hinários, com suas composições centenárias. Com o tempo, os clássicos do cancioneiro protestante foram sendo deixados de lado em benefício de cânticos chamados modernos. Mas por que tantos belos hinos caíram em desuso?
Algumas das principais razões podem ser aqui mencionadas e enumeradas. Em primeiro lugar, as composições tradicionais eram, em sua maioria, estrangeiras – alemãs, inglesas, americanas. Com o tempo, aqueles ritmos e melodias foram causando estranheza aos ouvidos brasileiros, acostumados a estilos musicais mais populares. Além disso, hinos célebres como “Óh quão cego andei” e “Vencendo vem Jesus” eram maciçamente executados, gerando certo cansaço. As novas gerações não conseguiram adaptar-se às canções mais antigas e buscaram novas formas de expressão musical. Isso sem falar em versos de difícil compreensão para os jovens. Um desses hinos, por exemplo, dizia em sua primeira estrofe: “Numa orgia nefanda, o rebelde Belsazar (…)”.
A grande revolução litúrgica que pegou desprevenidos os grupos tradicionais e pentecostais clássicos no Brasil teve lugar a partir da década de 1950. A chegada da Igreja Quadrangular e o surgimento de denominações como O Brasil para Cristo, a Igreja de Nova Vida e a Deus é Amor mudaram o perfil evangélico nacional. Foi por meio da nova onda carismática que o cenário mudou. E uma das transformações mais notáveis foi justamente o rompimento com a tradição musical protestante. Surgiram hinetos mais simples e curtos, repetitivos, acompanhados de palmas e instrumentos antes considerados “profanos”, como guitarra, bateria e órgão elétrico. A parte do culto dedicada ao louvor musical deixou de ser marcada pela reflexão e assumiu um caráter mais corporal e efusivo. E estas canções traziam como novidade os ritmos genuinamente nacionais, como samba e marchinha. Afinal, as novas igrejas eram autenticamente brasileiras – logo, não tinham necessidade de honrar uma tradição estrangeira.
Mas o que dizer dessa nova realidade? Os mais tradicionais, claro, afirmam que a qualidade musical diminuiu (o que é fato) e que o repertório evangélico moderno não é próprio para um culto verdadeiro. No entanto, é preciso ressaltar aspectos positivos da nova tendência. Um deles é a alegria comemorativa. Enquanto os tradicionais cantavam “Bendita a hora de oração” de olhos bem fechados, em contrição, os novos grupos começaram a fazer a festa do louvor, pulando, movendo braços e pernas e até dançando. Tudo com muito apelo para o contexto que a fé cristã assumiu em território brasileiro. A adoração meditativa cedeu lugar a uma adoração contemplativa. Em vez de enfatizar os feitos de Deus ou elementos teológicos importantes, ressalta-se muito a transcendência divina, que o fiel é estimulado a buscar e a sentir.
Uma particularidade dos novos cânticos é a forte ênfase no Antigo Testamento, enfatizando uma idealização de Israel. Querendo expressar uma fé mais concreta, os novos grupos encontraram ali fonte de inspiração, muitas vezes sem qualquer transposição cristã. Além disso, especialmente sob a influência da escatologia pré-milenista, tomou-se o povo de Israel como modelo – e o resultado é uma apropriação de temas e elementos tipicamente judaicos, como o uso de símbolos rituais como o candelabro, o shofar e vários outros.
No entanto, o novo cenário litúrgico também mostrou diversas fragilidades e problemas. Desde os dias do louvor ao som do iê-iê-iê dos anos 1960 até a chamada adoração profética, muitos problemas apareceram no contexto da Igreja contemporânea. Um deles é a introdução de heresias. Como são compostos por gente sem boa formação teológica, muitos cânticos afirmam verdadeiras tolices, como “Eu navegarei no oceano do Espírito”, ou “Casa de Deus, onde flui o amor”, etc. Infelizmente, muitas igrejas cantam diversos cânticos apenas porque gostam da melodia, sem observar se a letra tem ou não o mínimo fundamento bíblico e teológico. Ainda que não seja o caso de todos, há cânticos que não chegam a dizer nenhuma heresia – simplesmente, porque não têm nada a dizer! São peças que trazem frases simplistas, quase sem nenhum conteúdo. Essas músicas geralmente possuem bastante ritmo e algumas poucas frases, que são repetidas continuamente.
Não é possível que se possa louvar a Deus com entendimento usando composições tão pobres e vazias de conteúdo. Além disso, devemos reconhecer que, se queremos oferecer um louvor a Deus, precisamos fazê-lo com mais qualidade. Hoje, todos têm consciência de que é possível e perigoso fazer manipulação emocional usando determinados ritmos. Quando momentos de louvor chegam a quase uma hora de duração, repletos de cânticos eufóricos, o público fica emocionalmente desequilibrado. Submetidos a uma verdadeira catarse musical, muita gente já nem é capaz de fazer uma crítica do que está acontecendo. A verdade é que, em muitos casos, a repetição de cânticos torna-se quase hipnótica. O público fica eufórico – às vezes, até com certa demonstração de sensualidade – e acaba formando uma massa de pessoas altamente manipulável. Alguma coisa está errada neste tipo de louvor.
Há uma crença generalizada de que podemos cantar todo e qualquer texto bíblico, já que é a Palavra de Deus. Isso é um engano – e é exatamente nesse ponto que fica evidente a necessidade do estudo da hermenêutica (interpretação bíblica). Não se pode, simplesmente, cantar qualquer coisa, ainda que sejam versículos bíblicos. Às vezes, o trecho musicado traz uma idéia incompleta, uma teologia ultrapassada pelos ensinos cristãos ou declarações que precisam ser corretamente interpretadas. Ora, há músicas hoje que estimulam o crente a perseguir os inimigos e a destruir os adversários – práticas de acordo com o contexto das guerras de Israel, mas totalmente opostas ao que Jesus ordenou – perdoar e amar os que nos opõem, conforme Mateus 5.
Diante dessa nova realidade da Igreja, é importante ter bom senso e equilíbrio. É claro que precisamos de uma renovação permanente de nossa hinódia. No entanto, não se pode mudar por mudar, prejudicando a própria fé cristã. Por isso, louvemos ao Senhor com sensibilidade, mas também com bastante sobriedade.
Me fez lembrar uma música do Diego Venancio que curto bastante a letra:
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?v=l5ehvUASzRg